quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Espinhos. Estratégia de defesa, proteção.
E tamanha é a necessidade de defesa que nem as palavras sentem-se a vontade de sair, ficam perdidas, assustadas. Só saem de maneira afiada, sabe, aqueles espinhos fortes e doloridos? 
É muito antagonismo numa flor só. É bonita, simples, parece tão macia. E ao chegar perto, nada de cheiro gostoso, e espinhos, quantos espinhos!
Esses zunidos me confundem. Não consigo ignorá-los. Ora são marimbondos, ora são abelhas, ora, joaninhas. Não consigo distingui-las mais! E essas formigas cortadeiras?! Querem me fazer aos pedaços para alimentarem sua sociedade! 
E ainda me querem inteira. Me querem bonita, cheirosa, sem espinhos, leve, dançante, doce. Mas vem naturalmente, só mentes suicidas vencem o instinto de fugir da morte: quando menos espero, espinhos, espinhos, espinhos. 

Quem me viu quem me vê. Penso nisso todos os dias. 


segunda-feira, 23 de setembro de 2013

A caminho da curiosidade, ao encontro das surpresas

Acordei um pouco mais tarde do que havia me programado. Aproveitei a preguiça matinal trazida pelas nuvens de chuvisco e frescor. Uma manhã assim, parcialmente nublada, nem quente nem fria, muito me agrada. A vontade era de me integrar à força que gerava essa manhã tão agradáveç.
Também não tinha me programado para fazer exercícios. Mas senti que meu corpo pedia por uma caminhada. Meia horinha. Então eu fui, sabendo que perderia meia hora da minha programação - o dia está cheio de coisas e não posso me delongar. E fui... caminhando a passos lentos, pra aproveitar este início de primavera.
Hoje, primeira segunda-feira de primavera, todos saíram às ruas para varrer as calçadas. Um delicioso fenômeno social eu acho. Será que tem como meu dia não ser bom depois de tantos senhores me afirmando, ou desejando um "Bom Dia!"? Quase que duvido.
A audácia das flores e folhas que se libertavam de suas geradoras para ousar a liberdade do vento e ir parar em algum lugar, me levou também a novos caminhos,  desconhecidos. E a cada dobra de rua, uma surpresa diferente. As casas mais robustas se diluíam por meio das casas mais singelas. Todas elas, ricas em simplicidades. Que delícia de riqueza... a simplicidade.
Eu sei que não tinha me programado para caminhar hoje. Não sabia, entretanto, que existia tantos lugares a serem explorados. Muito menos que minha curiosidade e o encontro com diversas surpresas me levariam além, me fariam desconectar. Esqueci do horário, esqueci dos afazeres. Só fui, fui... Foram muitas imagens agradáveis para uma hora e meia de caminhada. Muita informação pra ser digerida. Provavelmente não consigo nem me lembrar de todas elas agora - mas deixemo-as pra outro momento.

O fato é que eu estou maravilhada: ainda existem lugares em Barão Geraldo em que, pelo menos aparentemente, o respeito ao próximo, humano ou não, ainda existe... em que os vizinhos se conhecem, as escolas são no mínimo atraentes em sua infra-estrutura. Em que as árvores e pracinhas são cultivadas pelos moradores. Em que as pessoas ficam conversando no portão. Em que parece que o "ter muito e do melhor e maior" ainda não faz parte da filosofia de vida das famílias.

Um lugar de diversidades não só sociais, mas muitas outras.

Enfim... quando vi, já tinha caminhado por tudo. Pra um lado e pro outro de meu bairro. Me surpreendido em praticamente todo o trajeto. E depois, me surpreendido quando vi que já fazia uma hora e meia que estava andando.

Que pesar a vida daqueles que nunca se deram a oportunidade de conhecer novos caminhos...

domingo, 7 de abril de 2013

Às leoas:


Eu não sei ao certo porque a gente insiste,
mas eu tenho certeza do porque
que a gente não desiste.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Diz que é superior...




Querido mascu: se você vive com esse discurso de que a racionalidade é o que nos faz diferente e principalmente superior aos demais animais, por favor: utilize esse seu argumento justamente para não se comportar como essas outras espécies de animais em que os machos ficam lutando como demonstração de força, virilidade, para serem escolhidos (que você tanto se diz “superior”). No mundo da racionalidade, é seu cérebro quem deveria demonstrar algum benefício como parceiro, e não seu dinheiro, muito menos sua força, seu músculo ou seu pinto.

Sobre aquela caixa amarela...


Dúvida, curiosidade, ansiedade...
Surpresa! Ah! Uau!
“Que legal... Que legal... Que massa, que massa! Nossa, noooossa!!! Ahhhh!!!”
Uma caixa mágica. A memória daquilo que se sabe mas que nunca se viu. O primeiro item: um casulo. E tudo foi exatamente como o surgir de uma borboleta, o desabrochar do casulo – como serão as asas, quais serão as cores. O que esperar? E depois, perceber que o que se esperava não  se compara nem a encontrar grão de areia em meio a uma praia inteira de descobertas.
Logo percebi que a caixa era um casulo de imagens e emoções.
A cada objeto, a cada fruto, semente, folha, uma emoção diferente, singular. Ao tirá-lo da caixa, construir uma única imagem com um tanto de história... Sensações indescritíveis.
Parecia que, em algum momento dessa minha vida – mundana ou não – eu já havia tido contato com tudo aquilo, mas que em algum momento eles ficaram escondidos em minha memória. Algo me tocou, pensando nos aspectos acadêmico:  como pode estudarmos tanto uma planta, tanta descrição, e não termos contato ao menos uma vez (na grande parte das vezes) com o exemplar daquilo que estudamos?
O redescobrir e, com ele o se emocionar... Como pode a natureza mudar tanto? Uma folha seca não nos é tão comum quanto uma folha verde ainda presa em sua árvore mãe. Aí, ao descobrir  que aquela folha verde tão costumeira ao nosso olhar é exatamente aquela que se transformou numa obra de arte da natureza, uma renda tão bonita, tão delicada que nos causa tanto encantamento e surpresa... Ah!
Perceber. Perceber (mais uma vez, como sempre) que a natureza não tem uma única finalidade. O fruto não só protege as sementes, mas pode ser também um instrumento. O algodão não só ajuda a dispersão das sementes, mas também servirá para tecer os fios! Perceber os ciclos, a natureza, perceber a relação natureza-natureza, natureza-animais...
Redescobrir coisas que eu não sabia que conhecia, reviver (e tão intensamente) outras que, um dia, já exerceram um poder mágico sobre mim – ah aquela concha, aquele cheiro de mar, de oceano, de imensidão... e as pedras! As pedras, as cachoeiras, a correnteza, a voz falando “Janaina! Firma esses pés na pedra, presta atenção na correnteza! Sinta essa energia...” Percebo que agora até a água, a correnteza, apareceu magicamente aqui. Lágrimas, alegria, emoção!
E é isso. Poderia olhar para cada item e tentar escrever linhas e linhas de cada um... Baldado.  A emoção foi tão intensa, que muito provavelmente ninguém, ao ler isso aqui, irá senti-la em seu completo...
Sublimarte.

A cria e ação


               Tudo começou numa conversa entre nós, participantes do projeto. Uma conversa típica de roda de amigos, descontraída, com risos e desabafos. Estes eram em sua grande parte relacionados à criação do personagem que interpretaríamos (interpretar? Hoje já não sei como chamar essa ação, logo menos explico o porquê) enquanto as crianças estivessem na horta.
              Em minha cabeça, as ideias do que ser iam e vinham, nenhuma delas muito convincentes de que seriam a melhor escolha... De repente, toda a aflição que me envolvia por conta da minha ansiedade, transformou-se no êxtase da criação. Longe de tudo o que eu poderia imaginar, de todas as ideias que já tinham passeado pela minha mente, surge um coelho!  Surgiu depois de o João nos ter contado sobre seu personagem –   Arruda “o mágico de bermuda, que do broto faz a muda”. Um mágico, numa horta... um coelho.
             Sabido qual seria meu personagem, outra aflição (seria eu a ansiedade em pessoa?): como seria interpretar esse personagem? Sua personalidade? Como é um coelho? Como ele agiria? Perguntas as quais todas as respostas que tentava encontrar foram em vão. Em vão porque, ao colocar a máscara pela primeira vez, tudo mudou. Foi numa tarde em que semearíamos. Quando a coloquei, a primeira grande diferença foi a voz. E ao preparar a terra, a vontade de fazer uma traquinagem. E daí, muitas outras características que vieram a me tomar conta sem, em nenhum momento, eu ter pensado delas: um coelho aprendiz, que gostava de trabalhar na horta, mas muito arteiro e as vezes artista. Guloso, e um pouco interesseiro (queria saber todos os processos para o funcionamento dos diferentes ciclos da horta para um dia, quando crescer,  ter a sua própria!). Todas as vezes em que coloquei a máscara, parece que em algum lugar adormecia meu verdadeiro eu, e imediatamente a Chin Chin despertava. Por isso a dificuldade em dizer que eu interpreto um coelho. Eu não interpreto, ele é quem por si só faz. Sinto-me apenas como mediadora. Mas ao longo do tempo, fui percebendo esse desdobramento, me percebendo como criadora do personagem apesar de ainda ter dificuldades em controla-lo.
             Da criação do nome: Chin-chin surgiu enquanto estávamos a caminho da escola, que faríamos a visita e convidaríamos as crianças a participar do projeto. Chin-chila. Pensava num nome que não designasse diretamente o gênero (até hoje é difícil responder a essa questão, se é que ela importa), e que fosse fácil. Chin-chin. Mas sentia falta de algo mais “crioulo”. Foi quando, numa aula, descubro que existe um coelho nativo do Brasil, ao qual os índios chamam de Tapiti! Mas que será de fato nome e não sobrenome para as turmas que virão.
                Das lembranças de Chin-Chin: é muito curioso pra mim como reajo as coisas quando estou com a máscara. Tento me enxergar fazendo as coisas que Chin-Chin faz. No primeiro dia, Chin-chin estava passeando pelo canteiro, quando o Cachola aparece para assustá-lo. É preciso muita agilidade pra fugir de um cachorro grande. Assim, Chin-Chin sai salticorrendo em disparada – certamente eu, Janaina, não reagiria assim. Provavelmente até eu conseguir reagir a um cachorro, já teria sido atacada!
                Uma das coisas que mais me marcou foi a reação de uma das crianças quando tentou tirar minha máscara. Quase todas as crianças entraram na mesma frequência que a Chin-chin estava, e nem questionaram se aquilo era ou não uma pessoa por trás de uma máscara, um personagem. No entanto, algumas queriam que eu tirasse a máscara. Aí Chin-chin respondeu: “mas é difícil tirá-la. Me cansa muito... mas você pode tentar”. É claro que a máscara estava presa de uma maneira que eu sabia que seria difícil de sair. Assim que a criança puxou a máscara, Chin-chin fechou os olhos, respirou fundo. A criança insistia. Chin-chin começou a amolecer o corpo, a respiração começou a enfraquecer. Nesse momento, outra criança, que também queria que a máscara fosse retirada, tirou a mão da amiga e disse, aflita “para! A energia dela tá acabando, deixa ela assim!”. Nesse momento, todas as crianças que estavam querendo que a máscara fosse retirada, tentaram segurar a Chin-Chin (que estava sentada, quase deitando no chão), e nunca mais pediram pra eu tirar a máscara... a não ser, no último encontro  da primeira turma, e ainda assim, alguns minutos antes de entrarem no ônibus. E foi muito bonito.
 Percebi que toda essa vivência funcionou como uma intervenção artística para as crianças. Resolvi tirar a máscara, já que se tratava do último dia. Antes de tirar a máscara, Chin-chin disse “então eu vou tirar a máscara, mas aí não sou eu quem estará aqui, e sim minha criadora. Ela se chama Janaina, tá? Conheçam-na então”, e tirei a máscara. Cumprimentei a todos com minha própria voz, e me apresentei pela primeira vez. Percebi muitos olhares: e surpresa, de alegria, de dúvida. Alguns me pareceram desapontados. Então pediram que eu colocasse novamente a máscara. Coloco, e Chin-chin fala algo rapidamente. E tiro novamente. Percebo uma certo espanto quanto a essa dualidade de personalidade Janaina x Chin-chin. Mas o mais interessante, o mais fascinante: muitos queriam colocar a máscara. O primeiro que a colocou e falou algo: falou com uma voz completamente diferente! Assim como acontecia com Janaina e Chin-chin! Outros, depois dele, colocaram minha máscara e falaram com vozes diferentes. E assim, eu, Janaina, os cumprimentava “Nossa, prazer! Que voz diferente! Como você chama?”. A surpresa foi quando um deles me disseram “sou xixi, primo do Chin-Chin”.  A máscara me pareceu um artefato de criação. Ao colocá-las, as crianças mudavam alguma coisa em seu comportamento. Algumas mudaram inclusive a personalidade. Sem ninguém pedir para que criassem, inventassem. Naturalmente.

Do semear no viveiro ao brotar da cria-ação


É claro que não se trata de onipresença, mas estar em qualquer lugar da horta é como que estar um pouquinho em todos os outros. De todas as atividades, desde a aprender o manuseio das ferramentas, seja usando a lima ou aperfeiçoando o movimento para usar o enxadão, um arquivo central é acessado, e vem então toda a memória das falhas e dos acertos, que nos permitem aprender , trabalhar, criar.
                O viveiro é o espaço em que as sementes des(a)pertam , transformando-se em mudas que depois serão acolhidas em algum dos canteiros feitos para recebe-las, onde então tornar-se-ão plantas grandes, para alimentarem ou para gerarem novas sementes.
Um espaço que é preciso atenção constante. Atentar para os momentos de rega, para o preparo cuidadoso da terra das sementeiras, e para o colocar das sementes em cada célula. No momento certo (como perceber quando é ele? Faz parte do observar...), cuidar para fazer o “repique”, nome dado ao processo de separação das mudinhas antes que fiquem grandes de mais para tal. Relacionamo-nos  com o mundo graças aos nossos sentidos. Tato, olfato, audição, visão  e paladar. Quando estamos dentro do viveiro, do nosso tato flui nossos cuidados... Manuseando a terra, as sementes, as pontas do dedo: descobrimos que nossas mãos vão para além das funções mecânicas. Mãos semeadoras. Mãos colhedoras. Mãos artísticas. É nessa descoberta das mãos que se percebe que para ser, basta fazer. E para fazer, basta estar. Estar dentro daquilo que se pretende, dentro da semente... E se assim for, tem-se então um broto germinado.
                Observar. Colocar na terra. “Surge uma pequena elevação! Agora, já vejo uma folhinha. E agora, duas folhinhas! Que será que plantamos aqui? O formato dessa folha parece tomate... ah não, é mostarda”. Saber qual é qual, quem é quem.
Observar. Passar a linha de um lado para outro, de baixo para cima. Surge uma teia de fios, ou uma estrela de oito pontas. Pintar uma folha em branco. Cores que se complementam, cores se contrastam. Ras-COR-tar , rasgar ou cortar cores, rascunhos, desenhos, e juntá-los numa composição. Dobrar folhas e costurá-las. Montar um caderno. “Ah, essas cores não combinaram... esses fios ficaram frouxos. A capa do caderno deu errado! Como faço? Deu certo!”
                Toda cria(ção) surge a partir do momento que o broto germina. Perceber que a audição, o olfato e a visão sempre estão. Mas o tato e a visão, junto com a praxe, é quem faz a ponte entre o observar e o aprender. É nesse ambiente que percebemos que a audição não é o sentido fundamental para o aprendizado – ressignificando os sentidos para que se faça sentido!
                Do ciclo das plantas para a criação artística, do germinar uma semente ao brotar uma arte: não existe um ponto inicial, nem um fim exato. Podem começar em lugar nenhum e terminar em qualquer lugar – ou o contrário, se preferir. Para cada um, percepções e perspectivas resultam em diferentes aprendizados, diferentes indivíduos. O broto ramifica-se e para cada ramo, uma expressão (criação) diferente, que só acontece pela interação com segundos e terceiros - animados (animo) ou não.
                Somos todos viveiros. Dentro de nós, muitas sementes. Nessa atmosfera diferente, desejamos que as crianças aspirem um ar que faça brotar essas diferentes sementes,  sejam de plantas,  sejam de artes, e que se percebam pequenos artistas, ou melhor, arteiros.

Da experiência no projeto Sementes Crioulas


(...)
     A vida passa quase que sem vida. Tenho aprendido a observar. Focar o olhar. Aguçar os sentidos! Existe muito para além do comum-normal-habitual. Como desnaturalizar o habitual para realmente encontrarmos nossa natureza? E como aprender isso? Ouvindo? Olhando? Tocando?
    O pouco que aprendi já é muito. O cuidado com as sementes. O uso de algumas plantas para nossa saúde, alimentando e curando. E a percepção em si... Não sabia que sabia sobre arte. Apreciar ou fazer uma arte. Tenho percebido que a arte é fluídica, basta se permitir. Parece-me quase que impossível exprimir tudo o que acontece, as sensações. São surpresas sempre.
    Algo interessante, a criação do personagem. Por estar condicionada a compreender as atividades como obrigações, de início foi uma grande aflição. De repente, parece que o personagem chegou até mim! Como se eu estivesse a beira de um rio naquela angustia-espera para que algo aconteça, e a correnteza traz uma barca  exatamente com aquilo que precisava. Mais uma vez, parece que se trata de deixar fluir e permitir. Queria um personagem travesso, vivaz, espertalhão. Mas como transportá-lo para o espaço viveiro-horta?       Descobrindo que aquele que dividirá o espaço criou um personagem que permite a criação de um outro personagem, com as características que eu gostaria. O mágico e o coelho! Coelho travesso, comilão, interesseiro! Que sabe muito bem sobre as mudinhas do viveiro e onde coloca-las na horta... que quer cuidar para que elas cresçam fortes  e fiquem bem grandes, para que ele coma tudo! E por aí vai... Um coelho-criança-arteiro.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Diários de uma ex moleca


               A profundidade do filme Diários de Motocicleta está na mesma profundidade em que planejamos nosso futuro sem saber se  presente nos levará a ele.  Guevara e Granado queriam apenas sair desbravando uma América que imaginavam, mas que não passava de idealismo. Como universitários que acreditam deter um conhecimento mais valioso que os outros, vão descobrindo a realidade, e mais, vão sentindo-a corpo a corpo, suor por suor, palavra por palavra. E vão percebendo que os conhecimentos não eram exatamente mais valiosos, e que a realidade era mais injusta e desigual do que imaginavam. Mas nada disso estava nos planos. Pelo menos não a dor que ela proporcionara.
                É um caminho sem volta. Eu também só queria entrar numa universidade, e aprender. Aprender não só com os professores, mas vivendo... Quando planejei minha viagem pela vida, não escolhi como roteiro um mundo em tons pastéis. Mas de repente, me vi ali, naquele tom pastel da terra seca dos nordestinos, com os gados magros e sem carne alguma. Me vi ali, conversando com aqueles companheiros que nasceram na mesma cidade que eu, mas estavam no meio de Minas Gerais lutando por um pedaço de terra fértil, já que o pedaço mínimo que tinham em sua cidade natal não lhes provia nada. Também não tinha planejado exatamente conhecer o Museu do Índio, que na verdade já havia deixado de ser museu e agora era uma ocupação de resistência índigena, com índios que lá estavam para lutar por serem minimamente respeitados e ouvidos numa terra em que um dia eles foram amigos e amantes (me recuso a falar que eles foram donos, pois duvido que algum dia tenham se sentido proprietários de alguma coisa da natureza) e que hoje eram massacrados, oprimidos, afastados... que a construção de um estádio de futebol, ironicamente nomeado com um nome tupi-guarani, “Maracanã” (semelhante a chocalho) seria mais importante que toda uma cultura indígena que havia se consolidado numa aldeia ali ao lado, que agora deveria ser demolida para a construção do estacionamento na copa, chocalhando toda a vida daqueles índios que nos receberam com tanta energia, com tanta fé, com tanta força.
                Também não fazia parte do meu roteiro, mas ao longo das curvas dessa viagem, não tive coragem de pedir para tantas mulheres se calarem quando contavam suas histórias de vida. E principalmente não achava que uma das paradas seria aquela escola de educação de jovens e adultos, em que 90% dos alunos eram mulheres senhoras, que contavam que estavam lá pois um dia tiveram que deixar de estudar em razão de sua família, pois os homens eram quem tinham o direito de estudar e trabalhar, ficando a responsabilidade da mulher fazer a comida, educar os filhos (que não significa alfabetizá-los), cuidar da casa, da roupa, e também do marido grosseiro, bêbado, e que vez ou outra na semana ou no dia-a-dia apanhavam ou escutavam grosserias. Nem imaginava que ia conhecer mulheres em depressão porque não eram aceitas por nenhum emprego porque eram “gordinhas” ou mulheres que vomitavam qualquer comida pelo medo de ficarem fora do peso. Mas raramente conheci homens que reclamavam ou que tiveram que deixar de estudar ou trabalhar. Nem homens bulimicos ou anorexos. Nunca ouvi nenhum homem contanto que apanhou de alguém que supostamente amava em função do álcool, ou porque aquela pessoa achou que simplesmente tinha o direito de agredi-lo.
                Numa das paradas, quando acordei com um morcego dormindo ao meu lado e com outros tantos voando, saindo daquele teto que estava despencando, ou quando vi aquelas baratas todas andando no meio do barraco.... quando vi mulheres se juntando para estudar e voltarem a estudar pois agora, depois de velhas, depois de terem conseguido criar seus filhos (a maioria fugiu com seus filhos do m(onstro)arido acreditavam que conseguiriam aprender a ler e escrever e conquistar um bom emprego. Quando, mesmo pela TV, vi pai e filho serem agredidos por terem sido confundidos como homossexuais... sempre pensei: não escolhi exatamente essa rota de viagem.
´              Concluo que a vida é assim, nós escolhemos um destino. Mas os caminhos que nos levam até ele nem sempre são certos, por mais tempo que passamos o planejando. Guevara e Granado ultrapassaram muitos dias do seu planejamento. Viveram grandes emoções, boas e ruins. Mas ainda quando nem imaginavam o que viriam a se tornar, já mudaram algumas vidas, tirando suas luvas de arrogância, de superioridade.
                Tiramos primeiro a luva, a barreira física que impede o real contato. Depois, tiramos a poeira que nos cega os olhos, que deixa nosso coração aflito... Tirei minha luva para tentar minimamente fazer  a diferença. Porque os caminhos pelos quais percorri, os fatos que aqui narrei, não tem e nunca tiveram placas de “RETORNO”. Mas tudo bem. Porque a realidade pode ser difícil, mas na vida real existem flores. Existem aromas, existem pássaros. A lua e o céu estrelado ainda aparecem em muitos lugares. E existe o amor. Independente do quão difícil seja o caminho, as flores e o amor sempre formam um arco-íris no horizonte, que nos guiam para nosso destino. O arco-íris reflete a esperança daqueles olhos. Olhos sem teto, olhos de mulheres, olhos dos homossexuais, olhos dos índios. Olhos que em meio a tempestade refletem o arco-íris do coração. E que Guevara conseguiu alcançar em sua viagem, e que Granado também encontrou.
                Acho que cada estrada mostra um arco-íris diferente. Na minha íris, as cores pastéis e fortes se mesclam depois de tanta realidade diferente. Uma aquarela tem sido pintada. Em meio a tempestades e secas, imagens desfocadas e nítidas.
                Não sou tão pretenciosa a ponto de pensar que chegarei no mesmo destino que Che. Mas tenho certeza que tenho conquistado pequenas revoluções. E que tenho ajudado muitos a pintar o quadro de suas vidas, registrando cada etapa da viagem. E aprendendo, e revolucionando tantos outros arcos oculres, devolvendo cor a tantas outras íris.
                E é claro, que venham outras tantas aventuras. E outros tantos caminhos. Meu destino é só um: justiça, amor e paz. Os caminhos? Estão na mão de Deus, como sempre me foi ensinado... nunca fazemos uma mala do tamanho que não conseguimos carregar, certo? Pelo menos eu, não.

sábado, 19 de janeiro de 2013

É só o que fica.



     Quando você está com todo mundo e só. E sente que você está só porque não é assim, como todo mundo. Percebe que é mais parecido com seus bichos, do que com os humanos que convivem com você. 
     Quando tudo o que você mais precisa é de alguém que esteja ao seu lado sem ficar te julgando, te questionando, fazendo teorias sobre seu comportamento ou te olhando com reprovação. Que está ali pra lhe proteger, pra trocar carinho. E recebe o amor mais sincero que você tem pra oferecer. E lhe dá a companhia mais agradável que poderia esperar naquele dia.
     E que sabe que a ausência não significa em amor menor. Não significa abandono. Sabe que são coisas da Terra, e que o amor pra sempre estará ali, intacto. E não importa quanto tempo fique fora, e quanto tempo fique junto: o tempo que for, quer seja um minuto ou um mês: será intenso, eterno enquanto dure. 

     Pra quem diz que a pior dor do mundo é a do parir um filho, é porque não sabe a dor de perder um.

     É realmente estranho saber que chegarei em casa e não terei mais vocês para ficar fofocado baixinho, quando estou triste, ou quando não quero falar com os humanos, que sempre tem alguma análise a fazer. 
    
Cérebro E racionalidade, são os desafios que vem de encontro com o tal do amor, da felicidade...







sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Gosto muito de te ver, leão.


       Estática, emudecida. Os dentes afiados do leão me fazem lembrar sangue. O rugido, guerra. O treinador entra na cela, aparentando tranquilidade. Suas pernas não tremem, parece não haver suor mesmo embaixo daquele Sol de verão. Tudo em mim parece paralisado (a sensação é de que o domador será comido vivo) menos  meu coração, que bate forte, bombeando sangue quente, quente do Sol e de expectativa. O Rei da Floresta ruge para intimidar qualquer ser animado que chegue perto. O domador mantém o olhar fixo nos olhos do desafiador, mostrando coragem. Na troca de olhares, respeito e confiança também são trocados. Frente a frente, finda o duelo – o leão se aproxima, abaixando a cabeça – o domador faz carinho, e lhe entrega um pedaço enorme de carne.
       Daí deve ter vindo essa minha inspiração para enfrentar o perigo, o medo. O leão não representa perigo... Perigosa são as ideias que nos passam sobre eles. Malvados, impiedosos, famintos, agressivos. São animais, assim como nós! Não posso falar sobre uma mente que não entendo, não domino. Portanto não posso interpretar nenhum outro animal, seja de minhas espécie ou não. Mas falo por mim em meus diferentes momentos, ou em minhas diferentes relações: mentes doentes, malvadas, impiedosas, agressivas. Variam em sua intensidade, mas todas são. 
        Domei o leão. Domei meu medo, minha insegurança. Agora somos próximos, nos conhecemos. Temos confiança um noutro. Sabemos que o que é falado sobre ele, leão, são palavras vazias. Ninguém ataca ninguém em situações de calmaria. Se o ataque acontece, é porque existe algum desequilíbrio. Estamos, nós dois, em calmaria. Em conhecimento. Em encantamento.
        Temos é que domar vocês. A relação de domador não está em amansar, domesticar o animal. Está em subjugar o que lhes é imposto (humanos) como verdadeiro. E vamos, eu e meu leão,  domando um a um, pouco a pouco. Rompendo com tabus, abrindo corações. Libertando corações de medo, de inseguranças e encorajando. São enfrentamentos que assim como o que contei no primeiro parágrafo, muitas vezes remetem aqueles que estão assistindo sangue, guerra... Mas a cada pessoa domada, um coração liberto.
       Segundo o dicionário, domar: (lat domare) vtd 1 Amansar, domesticar: Domar um potro. vtd 2 Dominar, subjugar, vencer: Os romanos domaram povos bárbaros. vtd 3 Refrear, reprimir (paixões). vpr 4 Conter-se, dominar-se.¹
        Eu sei que refrear, reprimir, conter-se,  não parecem ações que representem liberdade. Mas eu digo que sim. Queremos domar os corações reprimidos. Domar seu medo, seu preconceito, sua insegurança. Quando dominamos tudo aquilo que nos limita e impõe verdades as quais nosso coração não compreende, estamos concedendo a ele sua carta de alforria. 

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¹http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=domar

Do estudar ao apaixonar-se


A luz intensa reflete-se em sua camiseta branca e no livro aberto sobre a mesa. Seu rosto está sombreado em meio a tanta claridade. Sua mão não para – seus cabelos estão cheio de cachos grandes, todos enrolados pelos seus incansáveis (sempre incansáveis rs...) dedos. Era para estar focada nos livros, mas não... Seus olhos estão lá, perdidos no inimaginável. No desconhecido. No desconhecido, mas conhecido olhar que sempre vaga por aí, levando esses pensamentos que estão ora por perto, ora distantes... Esse passear dos olhos, esse viajar dos pensamentos acompanhados de leves movimentações do seu rosto (às vezes pequenos sorrisos se ensaiam, outras a testa se contrai). Fonte de encantamento. Sorrio. Não posso reclamar da sua “vagareza”. Só se eu fechar os olhos. Porque cenas assim me trazem encantamento. Pronto. Você está me olhando, toda inocente pensando que estou fazendo meu pôster, e eu aqui, admirando. Peço pra você parar de me olhar porque desse jeito nem terminar esse texto eu consigo, você me de desconcerta.  E me encanta. E me dá sorrisos gratuitos. E me deixa assim, apaixonada.
Bobinha.