Estática, emudecida. Os dentes afiados do leão me fazem
lembrar sangue. O rugido, guerra. O treinador entra na cela, aparentando
tranquilidade. Suas pernas não tremem, parece não haver suor mesmo embaixo
daquele Sol de verão. Tudo em mim parece paralisado (a sensação é de que o domador
será comido vivo) menos meu coração,
que bate forte, bombeando sangue quente, quente do Sol e de expectativa. O Rei da
Floresta ruge para intimidar qualquer ser animado que chegue perto. O domador
mantém o olhar fixo nos olhos do desafiador, mostrando coragem. Na troca de olhares, respeito e confiança também são trocados. Frente a
frente, finda o duelo – o leão se aproxima, abaixando a cabeça – o domador faz
carinho, e lhe entrega um pedaço enorme de carne.
Daí deve ter vindo essa minha inspiração para enfrentar o
perigo, o medo. O leão não representa perigo... Perigosa são as ideias que nos
passam sobre eles. Malvados, impiedosos, famintos, agressivos. São animais,
assim como nós! Não posso falar sobre uma mente que não entendo, não domino. Portanto não posso interpretar nenhum outro animal, seja de minhas espécie ou não. Mas falo por mim em meus diferentes momentos, ou em minhas diferentes relações: mentes doentes, malvadas, impiedosas, agressivas. Variam
em sua intensidade, mas todas são.
Domei o leão. Domei meu medo, minha insegurança. Agora somos
próximos, nos conhecemos. Temos confiança um noutro. Sabemos que o que é falado
sobre ele, leão, são palavras vazias. Ninguém ataca ninguém em situações de
calmaria. Se o ataque acontece, é porque existe algum desequilíbrio. Estamos,
nós dois, em calmaria. Em conhecimento. Em encantamento.
Temos é que domar vocês. A relação de domador não está em
amansar, domesticar o animal. Está em subjugar o que lhes é imposto (humanos) como
verdadeiro. E vamos, eu e meu leão, domando um a um, pouco a pouco. Rompendo com
tabus, abrindo corações. Libertando corações de medo, de inseguranças e
encorajando. São enfrentamentos que assim como o que contei no primeiro
parágrafo, muitas vezes remetem aqueles que estão assistindo sangue, guerra...
Mas a cada pessoa domada, um coração liberto.
Segundo o dicionário, domar: (lat domare) vtd 1 Amansar, domesticar: Domar um potro. vtd 2 Dominar,
subjugar, vencer: Os romanos domaram povos bárbaros. vtd 3 Refrear, reprimir
(paixões). vpr 4 Conter-se, dominar-se.¹
Eu sei que refrear, reprimir, conter-se, não parecem ações que representem liberdade. Mas
eu digo que sim. Queremos domar os corações reprimidos. Domar seu medo, seu
preconceito, sua insegurança. Quando dominamos tudo aquilo que nos limita e impõe
verdades as quais nosso coração não compreende, estamos concedendo a ele sua
carta de alforria.
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¹http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=domar
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